Ambição e ganância integram a história humana há muito tempo. De fato, pode-se dizer que existem desde que o mundo é mundo. Os livros mais antigos fazem referência a personagens caracterizados por tais atributos. Não por acaso, as histórias do Gênesis começam com a rebelião de um dos mensageiros de Deus que, movido pela ganância e ambição, descontentou-se com a própria posição que ocupava e empreendeu levar outros pelo mesmo caminho. Islamismo, Budismo e Hinduísmo, para citar apenas alguns dos segmentos mais destacados e antigos da cultura humana, também produziram histórias relacionadas com personagens movidos pela ambição e ganância.
Em nossos tempos, elas assumem o papel de molas mestras de uma sociedade que se volta como nunca antes para a valorização do individualismo e até para a exaltação da habilidade de explorar as fraquezas do próximo em nome de vantagens pessoais. O mundo, de fato, passa inegavelmente por uma fase de profundo mergulho no secularismo, e traz no bojo dessa viagem elementos corruptores daquela identidade que os grandes mestres da humanidade intentaram construir, mais justa e altruísta, e que até bem pouco tempo ainda se mostrava em alguma medida de evidência. Hoje não é bem assim.
Está na moda obter sempre mais e melhor para si, seja lá o que for. Antes considerado um defeito moral, a prática de julgar o valor das pessoas pelo que elas possuem nos bolsos ou em suas contas bancárias tem sido naturalizada pela mídia do entretenimento até mesmo como habilidade útil. Trata-se de um mundo composto por pessoas que já são maioria e que, apercebendo-se disto ou não, usam a ambição e a ganância, no que tais termos tem de mais pejorativo, como forças propulsoras de seus projetos, sonhos e maneira de enxergar a vida, as causas, a natureza e os demais indivíduos ao redor.
A ideia de que a felicidade é diretamente proporcional à capacidade de consumir é mais um dos estratagemas projetados pelo espectro dominante da ganância e da ambição. Uma é filha da outra, ou vice e versa. Assim, valores como honestidade, paz e justiça se tornam cada dia mais relativizados ante à superioridade do poder de consumo. Enxergar as relações entre tais características do nosso tempo exige pouco discernimento e ponderação, de tão evidentes que são.
Até que ponto tal conjuntura de valores será mantida? É possível uma reversão? Qual o papel das instituições públicas, do Estado, da família, da religião e dos indivíduos neste cenário? É este mesmo o caminho que a sociedade intentou seguir com a construção de valores mutantes, erigidos especialmente ao longo desta era de informação e de acessibilidade? É a atual sociedade cada vez mais amadurecida, ou está apenas cada vez mais apodrecida? São questões sobre as quais vale a pena se debruçar.